Sementes Sertanejas

Por Galeria da FAV

As sementes, como os corpos, migram, mudam, transitam por múltiplos tempos, espaços e territórios possibilitando tecer histórias. Como a vida, a história não pode ser pensada como um processo linear; é preciso reconstruí-la, recuperando e colocando nossos lugares de fala, nos entendendo como corpos atravessados pelo cotidiano, o político, o pessoal, o coletivo, os afetos, as memórias, os sonhos, as margens onde as experiências de vida não hegemônicas estão carregadas de resistência e resiliência. Como lembra a socióloga boliviana Silvia Rivera Cusicanqui (2018) “nada seria possível se a gente não desejasse o impossível”. É justamente esse compromisso com o desejo, com a criação de novas narrativas e com o reconhecimento do ser afetado em suas diferentes dimensões que a exposição Sementes Sertanejas se propõe a compartilhar. Sujeitas/sujeitos políticos artistas com diversas pesquisas técnicas e poéticas visuais, que tem habitado diferentes territórios do Brasil e que se encontram num espaço expositivo, também escola de arte, quilombo cultural, nos convívios cotidianos, compartilhando comidas, estudos e práticas artísticas, fortalecendo vínculos que semeiam sementes que se expandem nas dimensões pessoais e coletivas.

Sementes Sertanejas é composta por 15 artistas que são enraizados em vários estados brasileiros - como Pará, Mato Grosso, Rio de Janeiro, São Paulo, Goiás, Bahia, Tocantins, Minas Gerais, e fora do país, Honduras - e ramificaram-se por entre as terras e águas, até chegar ao Sertão Negro Ateliê e Escola de Artes. Sementes que imaginam outros mundos possíveis onde a ancestralidade de matriz africana faz parte da história, onde à hegemonia cisheterossexual é questionada, onde corpos ausentes se tornam presentes através da memória e dos sonhos, entendendo essas outras dimensões mentais como comunicação entre passado, presente e futuro. Em suas pesquisas, as artistas e os artistas, buscam dar contorno às “corporalidades inscritas por feridas histórica e socialmente constitutivas do mundo como nos foi dado conhecer” (MOMBAÇA, 2021); e assim, pintam as identidades apagadas, dizem dos corpos violentados, adentram a espiritualidade, costuram o feminino e os sonhos, propõem outras masculinidades para habitarem, falam das potências políticas dos afetos e das relações sociais.

A proposta que apresentamos se dá na imersão de processos poéticos e políticos no lugar de acolhimento e celebração do quilombo Sertão Negro, compreendendo que fazemos parte de um caminho percorrido e a percorrer. A exposição Sementes Sertanejas apresenta um recorte dos nossos encantamentos e desejos nesse mocambo, regidos por um solo que ensina, pulsa e gera, e pela sabedoria ao compartilhar os nutrientes desse terreno abundante e ensolarado, com novos movimentos, mudanças e migrações a serem enfrentadas.

 

Texto curatorial:
Sertão Negro

 

Artistas participantes

Abraão Veloso  

Augusto Cesar 

Eve Cruvinel 

Gabriela Chaves  

Genor Sales  

Jhony Aguiar 

lía vallejo 

Lucélia Maciel  

Manuela Costa Silva  

Matheus de Souza 

Òkun 

Rafael Vaz 

Tor Teixeira 

William Maia 

Xica